Alfred Chandler, seus críticos e o tamanho das corporações, por Thiago Martins Jorge
Em seu The Visible Hand, Alfred Chandler descreve, com detalhes, como aconteceu a evolução das práticas administrativas, nos EUA, entre o início do século XIX e meados do século XX. Iniciando pelo setor ferroviário – que teria sido o primeiro a adotar um gigantismo administrativo para enfrentar os inerentes problemas operacionais -, passando pelo telégrafo e outras atividades de infraestrutura, o autor chega até os setores comerciais e produtivos, onde as Grandes Corporações teriam se desenvolvido e consolidado de fato.
Tal minúcia descritiva, no entanto, não livrou o autor de críticas. As mais recorrentes, colocam em cheque o modelo empresarial que Chandler teria apontado como “vencedor”. Os críticos argumentam que nosso autor teria identificado, no modelo multidivisional, o modelo organizativo hegemônico – aquele que conferiria maior eficiência administrativa – e, portanto, teria sido adotado pelas corporações que dominaram os seus respectivos setores. Essa forma organizativa implicaria, contudo, na formação de corporações “paquidérmicas”, isto é, empresas altamente verticalizadas e burocratizadas.
Em função dessas limitações, e num contexto de rápido crescimento da renda per-capta (gerando consumidores mais exigentes), os críticos argumentam que teria ocorrido uma transição das “corporações chandlerianas” para um modelo organizacional mais descentralizado e flexível. Ou seja, aquele modelo que Chandler teria apontado como vencedor, na realidade, não teria resistido por um século (cf. Langlois, 2004; Lamoreaux, Raff & Temin, 2003).
Por outro lado, o próprio Chandler (2005), reagindo a essas críticas, argumenta que poucos exemplos são fornecidos para embasar essa narrativa e ainda ironiza o fato de seus críticos utilizarem a Toyota como um desses parcos exemplos (uma vez que a Toyota não seria um perfeito exemplar de uma empresa de pequeno ou médio porte). Mas mais do que uma simples ironia, devemos reconhecer que a contra argumentação chandleriana tem o mérito de se ater ao orçamento das empresas da chamada Nova Economia. Esse fato chama a atenção, pois nem Langlois nem Lamoreaux, Raff e Temin esclarecem muito bem o parâmetro utilizado para identificar o tamanho da corporações. Não coincidentemente, na falta de uma expressão melhor, os autores se referem, às empresas “do passado”, como “corporações chandlerianas”.
Posto isso, chegamos à questão central: o que define o tamanho de uma corporação? Ela é grande porque tem muitos prédios, muitas máquinas, muitos funcionários, muitos gestores ou muitos recursos? Apesar de parecer uma questão banal, a resposta não é simples e esbarra inclusive na “natureza das firmas”. E, como vimos, a forma como você encara (ou deixa de encarar) essa questão vai definir como você se posiciona nesse e em outros debates. Para nós, no entanto, não é nada disso que define o tamanho e a natureza de uma corporação e a Crítica da Economia Política nos ajuda a esclarecer isso.
O que são as corporações? Em breves palavras, podemos indicar que as corporações são meios de expansão de capital; e essa expansão acontece, via de regra, por meio do lucro (ainda que não possamos ignorar as atividades especulativas). Entretanto, para que a expansão ocorra, alguns problemas fáticos têm que ser enfrentados eficientemente, considerando o seu caráter inerentemente competitivo. Assim sendo, a forma como o mesmo montante de capital é mobilizado depende da inventividade de seus gestores e do que foi acumulado anteriormente.
A implicação prática disso é que o tamanho dos empreendimentos (recursos mobilizados) pode variar, em função dos problemas fáticos enfrentados, mas dentro de certos limites. Seria ao menos forçoso pensar que um montante colossal de capital pudesse ser mobilizado e expandido sem que, para isso, fosse convertido em uma quantia igualmente considerável de maquinaria, força de trabalho e recursos em geral, ainda que com equilíbrios distintos.
Mas, nesse ponto, começamos a tangenciar um outro problema (o qual só poderemos abordar numa outra oportunidade), que é a miopia do pensamento administrativo em relação ao tema da acumulação de capital. Por ora, fechando o breve debate, cabe reforçar que a contra argumentação chandleriana se mostrou superior aos argumentos dos seus críticos, pois teve o mérito de se ater ao orçamento das corporações mencionadas.
Referências
Chandler, A. (2005). Response to the Symposium: Framing Business History. Enterprise & Society, Vol. 6, No. 1 , pp. 134-137.
Lamoreaux, N.; Raff, D.; Temin, P. (2003). Against Whig History. Enterprise & Society, Vol. 5, No. 3, p. 376-387.
Langlois, R. (2004). Chandler in a larger frame, markets, transaction costs and organizational form in history. Enterprise & Society, Vol. 5, No. 3, p.355-375.
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