Tradução: Breves considerações sobre Bidenomics, por Matias Vernengo
Os comentários abaixo, traduzidos do original Some brief thoughts on Bidenomics (Thursday, August 17, 2023), por Matias Vernengo, somam-se ao interesse no monitoramento das influências das ideias econômicas nos desdobramentos do que tem sido chamado aqui e ali como “pós-neoliberalismo” no Brasil e nos EUA diante da retomada de medidas de inspiração keynesiana e supply-side. A figura também foi extraída do original.
Recentemente, muita coisa já foi escrita sobre a Bidenomics (um nome que pode ganhar tração, como Reaganomics; ninguém realmente pensa em Clintonomics como algo relevante). Trata-se fundamentalmente sobre o retorno da política industrial, embora pessoalmente ache que isso seja menos importante do que as pessoas pensam. Que eu não seja mal interpretado, pois são realmente importantes, tanto a redescoberta da política fiscal após a recessão de 2007-9 (sem pacotes fiscais após as recessões de 1990-91 ou 2001, mas com tais pacotes após 2007-9 e durante a pandemia em 2020) quanto a redescoberta da política industrial, em parte em razão da ascensão da China e em parte por causa da Pandemia/choque da cadeia de suprimentos. E a Bidenomics pode ter fôlego porque anuncia um Novo Consenso de Washington, que pelo menos em teoria abandona as posturas neoliberais do antigo consenso (veja o discurso de Jake Sullivan).
A preocupação é que em ambos os casos, na frente macroeconômica, ou fiscal, e na frente microeconomia, ou da política industrial, a retórica é mais forte do que a ação. Ou que assim será, de qualquer forma. Não estou tentando culpar Biden (ou sua equipe) por não romper (ou não romper o suficiente) com as visões convencionais. Quero dizer, posso ter minhas opiniões sobre o quão esquerdista ou progressista (ou mesmo pró-trabalho) Biden é (ele votou por todos os Acordos de Livre Comércio possíveis, mas pode mudar de ideia). Minha preocupação é o quanto o senso comum no Partido Democrata realmente mudou. E embora a recessão de 2007-9 tenha levado muitos Democratas e seus assessores a repensar sobre o consenso macroeconômico (não muito tempo atrás, Larry Summers dizia que os pós-keynesianos [posties] estavam certos e que a economia não tinha tendência ao pleno emprego), a inflação pandêmica fez o oposto, como observei aqui.
Se a lição foi que Summers estava errado (e Christina Romer certa) sobre o tamanho do pacote fiscal necessário para uma recuperação rápida à época, agora parece que a maioria dos economistas (no mainstream) concorda com a noção de que o excesso de demanda (particularmente o último pacote fiscal no início de 2021, e menos os da Pandemia, mas isso é outra história) causou inflação, e o Fed tardou e acertou em aumentar substancialmente as taxas. Observe que o mecanismo pelo qual o Fed reduziria a inflação é o convencional: maior desemprego, menor demanda, preços mais baixos (Summers, ironicamente, é um dos poucos que realmente traz à tona a questão do poder de barganha dos trabalhadores com menor desemprego). E esse diagnóstico permanece mesmo que o nível de desemprego não tenha diminuído (após a recuperação) ao mesmo tempo em que a inflação caiu significativamente.
Claro, ainda há espaço para discutir se o Fed (juntamente com o congelamento do crescimento dos gastos fiscais para o próximo ano pelo Congresso) acabará jogando a economia em recessão ou não. De qualquer forma, parte do legado da última crise será o reforço do novo modelo convencional de consenso. Observe, no entanto, que o risco político é enorme. Por isso Biden é forçado a defender a noção de que a economia (que se recuperou rapidamente da pandemia, sem dúvida) está indo muito bem. E, claro, a situação pré-pandêmica estava longe de ser ideal, e há uma razão pela qual nas últimas décadas surgiu um movimento operário de direita. Nisso, as políticas comerciais eram centrais, e a nova política industrial deveria desempenhar algum papel.
No front da política industrial, vale lembrar a existência do que Fred Block chamou de Estado desenvolvimentista oculto, o que sugere que os EUA sempre fizeram política industrial. Mas tenho dúvidas de que o principal efeito do Novo Consenso de Washington seja trazer de volta muitos empregos na indústria. A maioria dos empregos que o establishment quer afastar da China (ou pelo menos parte do establishment, como sugerem as opiniões de Adam Posen de que alguns estão em dúvida sobre isso) se mudará para outros países asiáticos, como o Vietnã e Índia.
De qualquer forma, há algumas razões para ser relativamente cético em relação à Bidenomics de uma perspectiva progressista. Claro, acho que isso é uma grande melhoria em relação à Clintonomics, que era apenas Reaganomics, porém mais fiscalmente conservadora.
Some brief thoughts on Bidenomics, por Matias Vernengo, foi publicado originalmente em Naked Keynesianism (Thursday, August 17, 2023).
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